Indústria integrada: trabalhar em rede para buscar inovação e competitividade
Notícias09/01/2020
A experiência, o olhar e vivência do outro são a fonte mais rica no processo de inovação
industrial para pequenos empreendedores. Estar integrado e antenado às novidades tecnológicas e acadêmicas
é primordial para entender as novas possibilidades de mercado, as mudanças nas necessidades dos clientes e as
rápidas transformações sociais e tecnológicas.
Essa avaliação quem faz é o pesquisador Augusto Machado, que estuda o setor industrial há
11 anos. Desde 2008, ele trabalha na Federação das Indústrias do Paraná (Fiep). Atualmente, é
pesquisador do Observatório do Sistema Fiep, responsável pela produção da Bússola da Inovação
- levantamento que faz um raio X nas indústrias paranaenses sob o prisma da inovação. O objetivo do trabalho
é entender como o conceito é colocado em prática nas empresas e fornecer subsídios para melhoria
da gestão financeira, recursos humanos, qualidade do produto e expansão dos negócios.
Para Machado, a integração é a principal resposta para um mundo em constante transformação.
“Eu diria que um ponto importante na pauta é essa possibilidade de a indústria poder interagir com diversos
atores que vão desde formas de financiamento e fomento, incubadoras, parques tecnológicos, os próprios
clientes, consumidores, fornecedores, centros de capacitação profissional, universidades. Um envolvimento maior
nesse processo de interação”, afirma.
O Paraná tem hoje 42,1 mil empresas industriais, segundo dados do Portal da Indústria. O número
representa 8,9% de empresas que atuam no setor industrial de todo o país. As micro e pequenas empresas respondem por
mais de 94% de todas as companhias do estado. O PIB industrial do Paraná é de R$ 90,3 bilhões de reais,
o que equivale a 7,8% da indústria nacional.
O destaque no cenário nacional também é observado no quesito inovação. Em junho deste
ano, três indústrias paranaenses conquistaram o Prêmio Nacional de Inovação. O estado também
foi o que apresentou o maior número de companhias finalistas.
Uma das vencedoras foi a empresa Boulle Móveis de Fundamento, que fica em Curitiba. Na modalidade micro e pequena
empresa, a companhia recebeu prêmios na categoria Inovação de Produto e também em Destaque Saúde
e Segurança no Trabalho.
Para o sócio diretor Rodolpho Guttierrez o segredo é buscar aprender sempre. “A gente viaja muito
para saber o que está acontecendo. Não só de tendência, mas de produtos atemporais também.
Nós temos um trabalho muito próximo com os fornecedores para desenvolver produtos com melhor acabamento, buscando
melhorar o padrão com relação a sustentabilidade. Mas o grande diferencial é o atendimento, entender
a necessidade do cliente e criar junto com ele um novo produto”, afirma.
Cultura da inovação
Inovar não pode ser uma ação pontual. A inovação tem que fazer parte da cultura empresarial;
tem de estar presente em todos os departamentos da empresa. Para o superintendente do Sesi (Serviço Social da Indústria)
e do IEL (Instituto Euvaldo Lodi) no Paraná, José Fares, quem não mudar a concepção do
trabalho, vai ser engolido pela tecnologia. “É um processo pedagógico, eu diria. Temos que fazer uma transformação
cultural, fazer com que (o empresário) sinta que não vai conseguir continuar se não fizer isso. Há
todo um processo de desenvolvimento mostrando que é possível investir em inovação tecnológica
a baixo custo. É esse o desafio”, pondera.
O superintendente explica que nem sempre é necessário adotar sistemas totalmente novos para desenvolver
o trabalho. Como exemplo, ele cita um sensor que está sendo desenvolvido dentro do Parque de Inovações
da Fiep e que possibilita um diagnóstico abrangente sobre máquinas antigas de uma indústria. Segundo
ele, o aparelho é colocado no maquinário e pode dar informações sobre a capacidade produtiva da
máquina, o nível de ociosidade que ela tem, se é possível obter a produção planejada,
entre outras funções. Além disso, o dispositivo alerta para a necessidade de manutenção
preventiva ou troca de ferramentas.
Esse sensor, além de trazer informações para tomada de decisão, melhora a produtividade de
uma máquina que está há 20 anos na empresa, por exemplo”, acrescenta Fares. O dispositivo ajuda,
especialmente, a indústria de pequeno porte, que tem mais dificuldades para fazer grandes investimentos em maquinário.
As melhorias podem vir até mesmo sem o advento de sistemas tecnológicos, tanto na indústria, como
no comércio ou no setor de serviços. Uma simples mudança na forma de enxergar o negócio pode impactar
positivamente. A Bússola da Inovação mostrou que 49% das indústrias do estado obtiveram melhores
resultados ao mudar práticas de gestão. Isso pode ser observado, por exemplo, com incremento da comunicação
interna, com estruturação de um setor para estreitar o relacionamento entre colaboradores e também com
fornecedores.
Outra mudança que pode ajudar é investir em atividades no ambiente de trabalho ou na qualidade de vida
do trabalhador, como um programa de incentivo ao exercício físico ou mesmo acompanhamento nutricional dos trabalhadores
e seus familiares.
Mas para que todos estejam dispostos a aceitar e, mais importante, buscar a inovação, o papel do líder
gestor é essencial. É ele quem fornece o ambiente propício para fortalecimento da cultura da inovação,
que precisa estar na essência do planejamento estratégico. Além disso, a prática só acontece
se houver a integração e o engajamento de todos os setores da organização. “Nas empresas
que trabalham inovação como cultura e como DNA, a inovação se dá de forma transversal.
Pode até existir um departamento, um núcleo de inovação, mas ela perpassa todos os colaboradores
nas empresas. Hoje eu diria que uma empresa que queira desenvolver a inovação tem que estar de uma forma complementar,
de uma forma multisetorial”, observa Augusto Machado.
O pesquisador cita o exemplo de uma indústria de Cambé, no norte do Paraná. A empresa, que conta
com 70 funcionários, criou um Conselho de Inovação e Sustentabilidade. 12 colaboradores integram o grupo.
Há um representante do setor de serviços gerais, um menor aprendiz, gerentes de recursos humanos e de produção,
além de colaboradores de outros setores estratégicos. Em trabalho recente realizado, 120 ideias foram debatidas.
Destas, 60 foram aprovadas e 30 puderam ser implementadas. “É o que a gente chama de dimensão da informação
e conhecimento: você buscar informações dentro e fora da empresa sobre como utilizar experiências
para gerar novos conhecimentos. Compartilhar informações para buscar soluções é um elemento
muito importante nesse processo”, completa.
Logística da indústria
Indústrias de grande e médio porte contam com sistemas de logística bem definidos e estruturados
para auxiliar no trabalho do dia a dia. Alguns pequenos empresários, entretanto, insistem em fazer do modo tradicional:
deixando todo o serviço concentrado no dono ou gestor principal do setor.
Hoje, são várias as ferramentas que facilitam o trabalho da indústria e que podem ser implantadas
independentemente do tamanho do negócio. Os conhecidos ERPs (Enterprise Resource Planning), ou, em português,
sistema integrado de gestão empresarial, ajudam no controle de estoque, chão de fábrica, a pagar e receber
contas. Com ele também é possível emitir notas, como de transporte, por exemplo.
Esses sistemas podem ser produzidos de acordo com o perfil da indústria. O gestor estratégico elenca as
prioridades para que o programa forneça as soluções esperadas. Os ERPs podem ajudar a fazer tudo isso
de maneira mais organizada, fácil e que pode ser compreendida por todos os funcionários da empresa. Tudo isso
economiza tempo, que pode ser usado para definir novas estratégias de liderança de mercado. Os ERPs podem ser
usados tanto na indústria, como no comércio e serviços em geral.
Busca por investimentos
Uma das grandes dificuldades, especialmente para o pequeno industrial, é ter recursos para investir em melhorias
e qualificação de pessoal. A Bússola da Inovação mostrou que 67% das indústrias
do estado investiram em inovação com recursos próprios. Nessas situações, a capacidade
de fomento fica mais restrita, já que depende da capacidade financeira da própria organização.
Apenas uma em cada três indústrias conseguiu captar recursos externos. Nesse universo, a principal procura
foi em fontes privadas. 24% dos industriais disseram conseguir recursos através de bancos e outros investidores. 17%
buscou fontes públicas, como a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico
e Social (BNDEs), o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o Banco Regional de
Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE), Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), entre
outros.
Análise dos pesquisadores da Fiep conclui que a baixa procura por financiamentos externos se deve, especialmente,
à falta de informação e excesso de burocracia no processo. A principal orientação ao pequeno
empreendedor é buscar atualização sobre todos os editais de financiamento disponíveis no setor
público, além de pensar em trabalhar com o financiamento coletivo, conhecido como crownfunding. Para que todos
esses processos estejam mais acessíveis, também é indicado manter toda documentação da
empresa atualizada e o detalhamento de projetos de inovação, especialmente para não esbarrar na falta
de tempo hábil quando houver editais abertos para captação de recursos.
Experimentação
Contar com apoio de projetos de pesquisa e desenvolvimento também é essencial num cenário em constante
aprimoramento. O Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) possui sete Institutos de Tecnologia (ISTs) no
Paraná. Os ISTs estão divididos por setores produtivos: alimentos, celulose e papel, construção
civil, madeira e mobiliário, metal-mecânica, meio ambiente e química, tecnologia da informação
e comunicação.
Os industriais também contam com um Centro de Tecnologia de Veículos Híbridos e Elétricos,
além de um Hub de Inteligência Artificial, com o objetivo de aumentar a competitividade da indústria fazendo
ao utilizar tecnologias de inteligência artificial. A iniciativa, que está localizada em Londrina, região
norte do Paraná, ainda dá os primeiros passos.
Uma das apostas é ousada: criar um assistente virtual inteligente que possa fornecer diagnósticos para
as indústrias, com auxílio em informações tecnológicas e gestão de processos. A
ideia é inserir na rotina do industrial uma ferramenta atualizada que possa trabalhar com a percepção
do mercado local e dar dicas e sugestões do que é feito no mundo de mais inovador.
Todos esses espaços servem para discussão e produção de tecnologias, além de aprimoramento
da mão de obra. Parcerias com universidades e centros tecnológicos também são essenciais para
se trabalhar com inovação.
Na região de Curitiba, por exemplo, existe a plataforma Academic Ventures, com a proposta de conectar indústria,
comércio e o agronegócio a projetos universitários que possam melhorar a economia do estado. A iniciativa
foi fundada pelo ex-reitor da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Zaki Akel Sobrinho. A plataforma completa um ano
neste mês e, para maturação do projeto, contou com consultoria de quatro meses junto ao Senai.
Os conhecidos parques tecnológicos também têm grande atuação na ajuda para alavancar
os negócios. Nesse tipo de empreendimento, empresas, universidades e o poder público atuam de maneira conjunta
para o desenvolvimento de pesquisa e soluções tecnológicas. Levantamento realizado pelo Sistema Estadual
de Parques Tecnológicos (Separtec) identificou ao menos 18 iniciativas espalhadas por todo o estado.
A Fiep também tem um espaço para fomentar, desenvolver e aprimorar startups e spin-offs (empresas que são
criadas através de outras já existentes). Chamada de Aceleradora Sistema Fiep, a iniciativa dá condições
para experimentação de novos negócios, com o objetivo de diminuir o tempo entre maturação
de ideias e aplicação no mercado.
Competências humanas
Não é fácil encontrar consenso no mundo dos negócios. Muitas fórmulas de sucesso que
foram usadas por décadas já não funcionam mais. No entanto, há um ponto com o qual todos os analistas
e consultores concordam: empresas são feitas de pessoas e nunca é demais investir no colaborador.
A Bússola da Inovação mostrou que, para os empresários, a terceira maior preocupação
quando se fala em inovar diz respeito à qualificação da mão de obra local. Para 24% das empresas
que responderam ao questionário esse quesito está inadequado ou muito inadequado ao mercado. Em segundo lugar,
aparece a falta de estrutura de suporte para pesquisa, o que, de certa maneira, também pode ser entendido como falha
na gestão de atividades e prioridades dos trabalhadores. A título de conhecimento, o ponto mais preocupante
para as indústrias engloba dificuldades para se trabalhar com leis e incentivos do poder público. 56% das empresas
consideram preocupante a falta de colaboração dos governos com o setor produtivo.
Mas investimento em mão de obra não quer dizer apenas aperfeiçoamento técnico. Para aumentar
a produtividade e buscar maior vantagem competitiva é necessário investir nas chamadas soft skills, que são
competências comportamentais necessárias para o sucesso no ambiente de trabalho. “É fundamental
falar de gente. Um grande desafio que a gente aponta é a questão do desenvolvimento e aprimoramento de competências
relacionais. De nada adianta eu ter uma competência técnica e consistente se eu não tenho essa capacidade
de me relacionar com outras instituições, outras pessoas, para expandir minha inovação”,
observa Machado.
Bússola da Inovação
A Bússola da Inovação é uma publicação produzida pela Federação
das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep) com o objetivo de nortear as indústrias do estado em práticas
de inovação. O conteúdo está disponível a qualquer pessoa, na página de web da Fiep.
O levantamento foi produzido com auxílio de 906 indústrias que se dispuseram a responder um questionário
sobre inovação no Paraná. A Bússola da Inovação está em sua 4ª edição.
Os dados foram coletados ao longo do ano passado (2018). 81% dos participantes são micro e pequenas empresas.
De todas as empresas participantes, 57% afirmaram que conseguiram melhoria significativa de um produto ou conseguiram
criar um novo produto ao consumidor. 49% delas avaliaram melhoria de um processo produtivo e o mesmo percentual também
observou melhoria nas práticas de gestão.
Para ter acesso ao material, basta consultar o site www.bussoladainovacao.org.br.